Cegueira da razão!

Começo citando José Saramago!

"Estamos a destruir o planeta e o egoísmo de cada geração não se preocupa em perguntar como é que vão viver os que virão depois. A única coisa que importa é o triunfo do agora. É a isto que eu chamo a: cegueira da razão."

Interessante no mínimo, ler esta citação de um gênio da literatura como Saramago. O homem que teve a lucidez de escrever uma obra enigmática, contemporânea, "pesada", triste, raivosa até, como Ensaio Sobre a Cegueira, traz a reflexão os problemas mundanos e humanos de falta de clareza e sensibilidade em perceber os danos que todos causamos ao planeta.

Saramago até onde sei não foi militante ambientalista, daqueles de abordar navio ou deitar no meio da rua para chamar a atenção, mas penso que o meio ambiente, a terra, água, o ar, o vento, tudo tinha um sentido para ele, assim como a conduta dos homens também era algo que o preocupava.

Não é difícil encontrar citações e pensamentos do escritor sobre mundo, política, comportamento, sociedade, futuro e ou presente, e é notável a sua capacidade de "leitura" dos fatos. Um exemplo é o que ele disse em 1995, três anos antes de ser considerado Nobel em Literatura:

"Este é um livro francamente terrível com o qual eu quero que o leitor sofra tanto como eu sofri ao escrevê-lo. É um livro brutal e violento e é simultaneamente uma das experiências mais dolorosas da minha vida. São 300 páginas de constante aflição. Através da escrita, tentei dizer que não somos bons e que é necessário termos coragem para o reconhecer”.

Profundo isso...

Porque o livro começa assim: "Um motorista parado no semáforo, subitamente descobre que está cego”. E assim segue esta história sobre uma epidemia de cegueira que ninguém sabe explicar. Isso transforma a cidade num caos, com pessoas isoladas e abandonadas à própria sorte.

E é aí, nessa situação de calamidade, que o escritor conduz o leitor para o outro lado de nossa humanidade. Quem de fato somos em condições de extrema necessidade? Esse é o ponto da obra. Até onde vamos quando tudo ao redor cai e o que conhecemos como sociedade se transforma em outra coisa?


O autor pretendia em seu livro mostrar como o ser humano é moralmente e culturalmente selvagem, egoísta e dominado por apetites bárbaros. Na obra Saramago "indica" que este ser humano bárbaro e animalesco precisa ser controlado, os seus apetites devem ser domados e necessita ainda de ordem e justiça social (que segundo ele apenas o comunismo pode garantir, mas aí é outra discussão que não cabe aqui). O fato é que crítica ou não a um modelo econômico, o que para mim chama a atenção na obra é essa capacidade de apontar para as características de nossa conduta (humana) que claramente queremos "mascarar" nas ações cotidianas.

Quem de fato é sorridente e bondoso o tempo todo? Quem de fato é reiteradamente carinhoso, amoroso, bondoso, exemplar em suas ações cotidianas? Com certeza existem seres diferenciados, com luz própria para clarear caminhos, enquanto outros não possuem a mesma "habilidade", mas pergunto, quem somos nos momentos em que com nós estamos?

Quem somos nos momentos em que com nós estamos?

Um ramo teoricamente novo da psicologia e que vem crescendo no Brasil é a Psicobiologia. De acordo com Frederico Graeff, professor da Universidade de São Paulo – Ribeirão Preto, considerado um dos raros especialistas brasileiros num ramo relativamente novo da ciência, a Psicobiologia, o cientista afirma que "nos animais de uma mesma espécie, a expressão de medo e submissão costuma provocar esse efeito calmante. Mas os homens, como se sabe, são capazes de matar sem se abalar pelo olhar de súplica de suas vitimas. Seria ingenuidade afirmar que isso é instinto biológico, pois aí o que agiu foi a cultura".

Seguem alguns links de reportagens sobre o assunto:

http://g1.globo.com/natureza/noticia/2016/09/natureza-violenta-dos-humanos-foi-herdada-de-ancestral-dizem-cientistas.html

https://super.abril.com.br/comportamento/de-onde-vem-a-violencia/

Os estudos apontam que o homem no decorrer dos séculos vem trazendo em seu currículo um longo histórico de guerras, matanças, abusos, atrocidades das mais variadas, reforçados por traços em seu DNA, ambiente, formação de sociedade e uma série de outros fatores. A questão é que instinto ou não, o ser humano é uma espécie de inteligência privilegiada, condutas sociais elogiáveis e que é o maior dos pesadelos para as outras espécies. 

Seja por instinto ou não, desde que nós humanos começamos a povoar a terra é fato que aos poucos dominamos o espaço, território, aniquilamos os "diferentes" e colocamos nossa posição no mundo. O exercício diário de todo indivíduo é controlar seu monstro interior e fazer a razão prevalecer sobre as emoções, embora é aqui que esta a imensa dificuldade.



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