Quando eu era criança pequena lá em...

Quando eu era criança lá em... Osório/RS, eu pensava que o Batman e o Robin eram irmãos. Que o Jaspion era um cara realmente diferenciado, que existia um planeta habitado por macacos e quem sabe a dominação poderia vir a acontecer. 


Pois é! Eu pensava em tantas coisas e imaginava o mundo que eu iria viver. Eu sonhava como um dia seria estar com alguém, se essa pessoa realmente iria gostar de mim, se teria filho e que cor de olhos ele teria... (Thanks God for everything)

Naquela época (metade dos anos 1970) eu brincava em uma praça que era imensa pra mim. Claro, eu era um minguado menino que via tudo gigante. Nessa praça uma árvore era especial para mim e meus amigos. Não sei que tipo era, se dava frutos, se era nativa, não sei nada disso. O que sei é que tinha galhos grandes, abertos e muito espaço para acomodar nossa turma de garotos e dali brincarmos de nave espacial em uma jornada por planetas e mundos desconhecidos.


Era uma época em que programas de tv funcionavam como os Smartphones nos dias de hoje. Tudo estava ali para a minha geração. Um horário atrás do outro éramos colocados em um mundo de entretenimento e diversão. Cresci acompanhando as histórias do dr. David Burner e sua capacidade de se transformar na temível criatura verde. Aqui um parênteses, em algumas casas o Incrível Hulk não tinha cor, figurava em um preto e branco rabuscado. Lá em casa também era assim. 


Fui ver cor na tv em 1982 quando meu pai comprou uma Sanyo para a Copa do Mundo de Futebol na Espanha. Dizia meu pai que era possível enxergar os cadarços das chuteiras dos jogadores de tão perfeita que era a imagem (sic).


Quando eu era criança pequena lá em Osório eu aprendi que a cultura do lugar onde você vive é importantíssima para a tua formação como indivíduo. Percebi ainda pequeno que a cor não difere bondade ou maldade e que não é pela pele que se forma o caráter de alguém. Desde cedo aprendi que você pode ser aceito em qualquer ambiente e não importa tua condição social e financeira.

Cresci com a figura de uma pessoa em casa para ajudar a gente no dia a dia. Em dias de hoje seria uma au pair, digamos assim. E olha, quanta saudade dos momentos juntos, das risadas soltas que tínhamos, do olhar carinhoso e atento, das vezes que eu era repreendido das minhas estripulias. Que tempo que não volta mais. 


Saudade das idas para a casa dela e que para mim era uma tremenda aventura. Viajar de ônibus, atravessar um pequeno riacho por uma pinguela (espécie de ponte rústica de madeira) e viver a emoção do balanço que só esse tipo de passagem tem... E depois, o convívio com a família grande de crianças da minha idade, meninos, meninas, alguns maiores, ali juntos primos, tios, pais, avós, todos da família... Neli era o nome dela! Tinha um sorriso contagiante e olhos negros que falavam por si só.

O tempo que viveu com a gente foi marcante. Com ela aprendi a gostar de samba raiz. Às vezes íamos juntos ao bailinhos de domingo a tarde para acompanhar os ensaios de blocos de carnaval e do Grupo Maçambique de Osório. Eu, um guri de sete, oito anos, sendo recebido em um clube lotado de energia e animação. Destaco aqui que nunca me senti excluído, afastado, ignorado, ou fora de qualquer contexto nesse lugar, mesmo sendo muitas vezes o único menino branco a estar ali...


Quando eu era criança pequena lá em Osório eu nunca imaginaria que um dia apareceria na telinha daquele aparelho que tanto me fascinava. Fui um guri tímido, na minha, de observar e me calar perante os outros, porque eu colocava uma "distância segura" entre mim e "eles". Fiz isso por um longo tempo... Embora não percebesse meu lado comunicativo e "solto" (pra falar dentro dos termos audiovisuais), no fundo eu sabia que estaria próximo da comunicação.


Hoje vejo que o tempo que vivi quando criança lá em Osório foi fundamental para a minha formação humana. Fica a saudade das amizades deixadas pra trás, da pequena escola metodista onde aprendi a importância de acreditar em algo maior...


Das tardes de domingo na fazenda dos meus tios (Fernando e Eva) e seus búfalos, vacas de leite, cavalos, galinhas de angola, patos, gansos, da horta cercada de taquara e do taquaral para atacar o vento. 


Tem um ditado antigo que diz: "conheça Osório antes que o vento carregue". Essa é uma verdade e tanto. Estive em Lisboa/Portugal e lembrei várias e várias vezes da minha cidade de infância. Sou de Erechim, norte do RS, mas de coração tenho por Osório um amor imensurável... Já morei em muitas cidades desse estado e me mudei em cada cidade muitas e muitas vezes, mas sempre bate saudade daquele tempo, onde o rompante do vento é uma constante, os banhos de lagoa eram sensacionais e os passeios de bicicleta libertadores...


Ah, quando eu era criança pequena lá em Osório... 





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