Arte, Rock e Arquitetura


Arte, Rock e Arquitetura

Hoje conheça a história de um daqueles caras que no peito e na coragem fizeram a diferença. Seu nome, Luiz Brasil Fiori, para os íntimos, Luigi. Filho de Eloy Anisyo Fiori e Noemy Rigon Fiori é pai de Piero. Luigi nasceu na cidade de Erechim, norte do Rio Grande do Sul no dia 21 de junho. Arquiteto, artista plástico, membro do MAPE, Movimento dos Artistas Plásticos de Erechim, com forte trabalho de divulgação e resgate das artes na região e no estado, Luigi é antes de tudo um grande amigo. 

Eu o conheci em 1994 quando ele tinha recém chegado do Rio. Na época, eu era um adolescente inquieto e curioso querendo desbravar o mundo, e ele, um desbravador procurando mares mais calmos e tranquilos. As viagens, a carreira, as amizades, curiosidades, e principalmente a arte, o combustível que moveu e move a vida desse cara por todos esses anos, são alguns dos ingredientes que vamos abordar a partir de agora.

Jean: Luigi, Você sempre teve admiração pelos projetos arquitetônicos e por obras de arte, isso começou desde pequeno ou foi se materializando com o tempo?   

Luigi: Sempre tive forte inclinação para as artes. Desde pequeno interessava-me pela pintura e os grandes projetos. O meu sonho nessa época já era a arquitetura.  Em 1970, aos 17 anos, pedi emancipação aos meus pais e fui morar em Porto Alegre na casa de uns amigos da família. Nessa época o encanto da noite cultural porto-alegrense me conquistou. Comprei uma máquina fotográfica e saí pelos bares e pubs da capital registrando tudo. Grandes eventos, exposições de quadros, shows de rock, enfim, tudo que tivesse um foco cultural. O interessante é que eu entrava muitas vezes sem pagar nada nestas festas. Eu conhecia as pessoas do meio artístico de Porto Alegre, e elas me deixavam entrar de graça, de penetra, não tinha nenhum problema.

Jean: E como eram essas aventuras? Você chegava a conhecer muita gente importante ou isso não acontecia?

Luigi: Conhecia sim, com certeza. Cada vez que eu saía, tinha a oportunidade de conhecer pessoas novas e diferentes. Tive a chance de fazer grandes amizades que graças a Deus duram até hoje. O roqueiro Foghetti Luz (ex-Bixo da Seda), Nei Lisboa, Kleiton e Kledir (na época era os Almôndegas), o deputado federal José Fogaça (compositor e letrista), e também Paulo Casarin (Tecladista de artistas como Lulu Santos, Gilberto Gil e Pepeu Gomes), são alguns amigos que eu fiz nessa época e que nos relacionamos até hoje.

Jean: Como foi esse início fotográfico? Dava muito trabalho fotografar?

Luigi: Como dava, era trabalhoso mas muito compensador. Era uma coisa que eu curtia muito, mas muito mesmo. Levando em conta que eu não sabia nada de fotografia e que aprendi quase que como autodidata. Fotografar para mim me proporcionou ótimas lembranças e muitas alegrias.

Jean: E como se deu o final dessa fase? Como foi a saída da fotografia para a pintura e o ingresso na arquitetura?

Luigi: A saída foi quase que automática. Para mim a fotografia na noite porto-alegrense começou estagnar. Nessa época comecei a cursar arquitetura na UNISINOS e a veia artística para a pintura e a serigrafia manifestaram-se muito forte em minha pele. Eu usava nos meus trabalhos um aerógrafo, uma espécie de jato de tinta de ar, de prático manuseio e que facilita muito o trabalho para quem atua nesta área. O aparelho foi de muita utilidade nos meus trabalhos. Uso ele até os dias de hoje. O legal é que nessa fase da minha vida, acabei virando cenógrafo, isso mesmo, fazia cenários de peças de teatro, pintava painéis, fazia composição de palco para bandas de rock da época, além de pintar quadros e instrumentos musicais. Também fiz muitos adesivos para pranchas de surf e asa delta. Trabalhava por conta própria, sem patrão, sem chefia, o único desejo que eu tinha era a liberdade e a vontade de ser o dono do meu negócio e fazer aquilo que mais me desse prazer e satisfação.

Jean: Que época era isso? Você lembra assim de cabeça, mais ou menos em que ano foi essa fase?

Luigi: Lembro, e como lembro. Era o final dos anos 70, ditadura militar, censura e tudo mais. Mas é como eu sempre digo, censura, repressão e ditadura não funciona no meio artístico. O artista sempre inventa, cria um jeito novo, de burlar, de maquear a situação adversa em que ele se encontra e conseguir assim mostrar, e divulgar o seu trabalho.  Voltando a tua pergunta, realmente, como eu estava dizendo, era o final dos anos 70, e a coisa não estava nada fácil para nós que vivíamos da arte. Na verdade não estava fácil para ninguém no Brasil, não é mesmo? Bom. E aí, o que fazer?  Pensei, vou me embora. O meu curso de arquitetura na UNISINOS estava legal, mas não era nenhuma maravilha, e o cenário artístico de Porto Alegre estava em baixa. Entrei em contato com alguns amigos que eu tinha no Rio de Janeiro, entre eles o Paulo Casarin, que morava na capital carioca há muito tempo e me mudei para lá. Nessa época eu tinha um Passat 77, juntei minhas coisas, coloquei todas minhas coisas, meus discos, meu aerógrafo e alguns aparatos artísticos como pincéis, telas, tintas e fui para o Rio.


Jean: E chegando lá, a adaptação foi fácil?

Luigi: Foi cara, graças a Deus eu tive grandes amigos que me propiciaram grandes amizades, sem eles com certeza, tudo seria mais difícil. Fiz minha matrícula de arquitetura na Universidade Santa Úrsula no Rio e recomecei a estudar. Faltavam dois anos para minha formatura e aproveitei o tempo para agilizar alguns trabalhos. Vale à pena lembrar que eu morava com o Paulo e outro amigaço meu, o Mauro Kwitko que era pediatra, e trabalhava no Rio já fazia um bom tempo. Morávamos num apê dois por dois, que vivia cheio de gente, e eu tinha que dormir na sacada, porque na maioria dos dias o apartamento estava lotado. “Tudo vale a pena, se a alma não é pequena”, essa é a minha filosofia. Como eu estava te dizendo, consegui trabalho. Como? Através do Paulo, que nessa época tocava com o Lulu Santos, e sabendo que eu trabalhava muito bem com pintura, serigrafia e designs, arrumou uma boquinha no estúdio que o Lulu gravava. O nome do lugar era Multi Estúdio, na Barra da Tijuca, hoje não existe mais, fechou. Qual era a minha função? Como eu desenho bem, começaram a me deixar fazer esboços de capas de discos que viriam a ser o trabalho final dos artistas. Pôr exemplo, o artista estava com todo o seu trabalho finalizado, faltava a capa do LP. Eu fazia o esboço, baseado num feedback entre o estúdio e o artista, e nós apresentávamos para o cara. Se era realmente isso o que ele imaginava, o trabalho saía do papel e virava realidade. Com o tempo, comecei eu mesmo a fazer as capas dos LPs, não existia CD nessa época. Tive a chance de trabalhar com Elis Regina, Pepeu Gomes, Dodô e Osmar, Hanói Hanói, fiz a capa de disco para um grande amigo meu chamado Repolho, percussionista do Caetano, da Gal, do Pepeu. Fiz a capa do primeiro disco da Zélia Duncan, o primeiro mesmo, quando ela se chamava Zélia Cristina Duncan. Conheci Roberto Frejat e Guto Gofi do Barão Vermelho. Tive a oportunidade de bater altos papos com o grande poeta urbano Cazuza, além do Leó Jaime, Lobão, Evandro Mesquita e Fernanda Abreu nos bons  tempos da Blitz. E trabalhei também com alguns artistas gaúchos, como os Garotos da Rua e os Cascavelletes. Com o tempo acabei pôr me formar e consegui montar o meu escritório de  arquitetura juntamente com o meu ateliê. As artes e a arquitetura sempre andaram comigo lado a lado.

Jean: Realmente é uma bela trajetória de vida, mas o que te fez voltar para casa? Saudade, ou cansou do show business?

Luigi: Não, cansar do show business, não, isso é um vício. Quanto mais você faz, mais você quer fazer. O que houve mesmo foi uma mescla de saudade de casa com alguns problemas de saúde do meu velho. Hoje infelizmente ele já não está mais conosco. O que houve mesmo foi um retorno em virtude da saúde dos meus pais, que pensando agora de cabeça fria, depois de todo esse tempo, vejo que a minha decisão foi muito sensata. Vim embora na hora certa. Deixei muitos amigos, alguns nunca mais verei, mas com muitos converso e me relaciono até hoje, e no mais, voltei para minha terra natal, mais de 20 anos depois de ter ido embora. Reencontrei grandes amigos, montei meu ateliê, coincidentemente na mesma casa onde eu nasci.


Jean: Você tem planos, novas mudanças ou não é bem isso?

Luigi: Não. Não penso em me mudar, penso em criar, fazer grandes projetos para  a minha cidade, minha região, quem sabe até o meu estado. Penso em curtir meu filho, aproveitar cada dia do seu crescimento, sem perder nada. Penso em ter paz, ter muita luz. Penso em aprender a tocar violão, é uma coisa que eu sinto não ter aprendido. Quero viajar também, aproveitar essa estabilidade que eu consegui ter e aproveitar mais a vida.

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